Um cirurgião vascular britânico foi sentenciado à prisão após ser condenado por um esquema de fraude elaborado, no qual provocou a amputação das próprias pernas para reivindicar uma indenização milionária de uma seguradora. O caso, que chocou o Reino Unido, revelou detalhes perturbadores, incluindo motivações sexuais por trás das automutilações e o armazenamento de pornografia extrema.
A Condenação e a Sentença
Na última quinta-feira, dia 4 de setembro de 2025, o médico Neil Hopper, de 49 anos, foi formalmente condenado por fraude. A acusação principal girava em torno de sua tentativa de obter cerca de 671 mil dólares, o equivalente a aproximadamente 3,6 milhões de reais, em indenizações de seguro pelas amputações que ele mesmo havia causado.
O juiz James Adkin proferiu a sentença de dois anos e oito meses de prisão para Hopper. Além da pena de reclusão, o cirurgião também foi alvo de uma ordem contra danos sexuais, com validade de dez anos. Esta medida legal visa impor restrições a comportamentos considerados de risco, com o objetivo primordial de salvaguardar a população.
Hopper também se declarou culpado de possuir e armazenar imagens pornográficas de natureza extrema. Entre o material encontrado, estavam vídeos provenientes do site “EunuchMaker”, conhecido por conteúdo de modificações corporais radicais e que exibia mutilações genitais.
A Fraude e a Decepção Orquestrada
A investigação revelou que, em 2019, o cirurgião Neil Hopper utilizou gelo seco para congelar intencionalmente suas próprias pernas. Após o incidente, ele foi levado a um hospital, onde apresentou um quadro clínico falso, alegando sofrer de diarreia e vômito. Inicialmente, os médicos o trataram sob a suspeita de sepse, uma condição grave caracterizada por uma resposta inflamatória sistêmica a uma infecção, que pode levar à falência de múltiplos órgãos.
A farsa de Hopper foi mantida por um tempo. Posteriormente, ele passou por uma dupla amputação dos pés e, em uma cirurgia subsequente, teve as pernas removidas abaixo dos joelhos. O tribunal concluiu que o médico deliberadamente ocultou dos profissionais de saúde a verdadeira causa de seus ferimentos, perpetuando o engano para viabilizar sua reivindicação de seguro.
Motivação e Conexões Suspeitas
Durante o processo judicial, ficou evidente que Neil Hopper nutria há muito tempo o desejo de se tornar um amputado, e que essa aspiração estava intrinsecamente ligada ao prazer sexual. Essa motivação foi um fator crucial na decisão do tribunal.
A Ligação com o “EunuchMaker”
O caso de Hopper ganhou mais complexidade ao ser descoberto durante as investigações sobre Marius Gustavson, o idealizador e operador do controverso site “EunuchMaker”. Gustavson, que também havia passado por automutilações, incluindo a remoção do pênis e de uma perna, era conhecido por auxiliar outras pessoas em procedimentos de amputação de partes do corpo. Ele foi condenado à prisão perpétua por um tribunal de Londres no ano passado, em um caso separado, mas interligado.
A promotoria detalhou que Hopper havia adquirido três vídeos do site de Gustavson, os quais retratavam homens submetidos a remoções genitais. Além disso, foi comprovado que o cirurgião mantinha milhares de mensagens trocadas com Gustavson, nas quais discutiam suas próprias amputações e interesses em modificações corporais.
A BBC noticiou que o tribunal esclareceu que os crimes de pornografia extrema cometidos por Hopper estavam relacionados exclusivamente a vídeos de mutilações corporais comprados online e, crucialmente, não envolviam crianças, o que diferenciou a natureza de seus delitos de outros casos de pornografia infantil.
O Histórico Profissional e a Posição do Hospital
Neil Hopper, que era pai de família e casado, atuava como cirurgião no Royal Cornwall Hospitals NHS Trust (RCHT), uma instituição que faz parte do sistema público de saúde do Reino Unido. Ele esteve empregado no hospital de 2013 até sua prisão em 2023, momento em que seu registro médico foi imediatamente suspenso.
Em um comunicado oficial, o RCHT expressou que, embora os detalhes do caso sejam “chocantes” e profundamente perturbadores, as condenações de Hopper não possuem qualquer conexão com sua conduta profissional enquanto médico. O hospital enfatizou que uma investigação policial exaustiva não encontrou evidências que ligassem as práticas criminosas do Sr. Hopper ao atendimento prestado aos pacientes.
“Durante uma investigação policial minuciosa, não foram encontradas ligações entre as práticas criminosas do Sr. Hopper e o atendimento prestado a pacientes”, reiterou o Royal Cornwall Hospitals NHS Trust, buscando tranquilizar a população sobre a segurança dos serviços de saúde oferecidos.
Fraudes de Seguro e Modificações Corporais Radicais
Fraudes contra seguradoras representam um desafio significativo globalmente, custando bilhões anualmente e impactando diretamente os prêmios pagos por outros segurados. Tais esquemas podem variar de pequenos golpes a elaboradas tramas envolvendo falsificação de documentos ou, como neste caso, automutilação para reivindicações de invalidez.
O contexto das modificações corporais radicais, como as promovidas pelo site “EunuchMaker”, levanta questões éticas e legais complexas. Enquanto algumas formas de modificação são culturalmente aceitas, a autoamputação ou a assistência a ela para fins não médicos, especialmente quando motivada por fetiches sexuais ou transtornos de identidade de integridade corporal (BIID), é um campo nebuloso. A condenação de Marius Gustavson por crimes relacionados à mutilação genital e amputações ressalta a seriedade com que as autoridades britânicas tratam a exploração e o auxílio em automutilações extremas, mesmo que consentidas, quando estas cruzam limites legais de danos corporais graves.