Senado aprova isenção de IR para salários de até R$ 5 mil, intensificando pressão sobre a Câmara

Representação gráfica de cédulas de dinheiro e documentos fiscais, simbolizando a tributação e a isenção do Imposto de Renda.

Em um desdobramento significativo no cenário político-econômico do Brasil, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal aprovou, nesta quarta-feira (24), um projeto de lei (PL) que estabelece a isenção do Imposto de Renda (IR) para trabalhadores com rendimentos mensais de até R$ 5 mil. A medida surge como uma alternativa à proposta do governo federal, que enfrenta lentidão na tramitação na Câmara dos Deputados.

Aprovação Unânime no Senado

O Projeto de Lei 1.952 de 2019 obteve aprovação unânime na CAE, com 21 votos favoráveis. Devido ao seu caráter terminativo, o texto tem potencial para seguir diretamente para a Câmara dos Deputados, sem a necessidade de votação no plenário do Senado, a menos que seja interposto algum recurso que exija a apreciação pelos senadores em plenário. Essa celeridade na tramitação reflete a urgência e a relevância que o tema adquiriu no Congresso Nacional.

Contexto Político e Rivalidade

A relatoria do PL no Senado ficou a cargo do senador Renan Calheiros (MDB-AL). A escolha do relator não é trivial, dado que Calheiros é conhecido por sua rivalidade política em Alagoas com o deputado federal Arthur Lira (PP-AL), que, por sua vez, é o relator do projeto de isenção do IR na Câmara. Essa dinâmica de oposição entre figuras políticas influentes adiciona uma camada de complexidade e tensão à discussão sobre a reforma tributária.

Principais Disposições da Proposta do Senado

O projeto relatado por Renan Calheiros não se limita apenas à isenção para quem ganha até R$ 5 mil. Ele também prevê uma redução na cobrança do IR para a faixa de renda entre R$ 5 mil e R$ 7.350, espelhando uma faixa idêntica à proposta apresentada por Arthur Lira na Câmara. Além disso, para garantir a compensação fiscal necessária e evitar impactos negativos nas contas públicas, a medida propõe um aumento na tributação para indivíduos com rendimentos anuais superiores a R$ 600 mil.

Acusações de Manobras Políticas e Desbloqueio da Pauta

O senador Renan Calheiros foi explícito ao afirmar que a votação do projeto na CAE teve como objetivo principal “destravar” a tramitação da isenção do IR na Câmara. Segundo o parlamentar alagoano, a proposta do governo estaria sendo utilizada como “moeda de troca” para a aprovação de outras matérias de interesse, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Blindagem e a anistia para condenados pelos atos de 8 de janeiro. Calheiros enfatizou a importância da matéria, classificando-a como “de grande relevância para a correção de injustiças tributárias com as pessoas de menor renda”, reiterando o caráter social da iniciativa.

Pressão sobre a Câmara dos Deputados

A ação do Senado parece ter surtido efeito. Em uma reunião de líderes realizada na terça-feira (23), ficou acordado que o projeto do governo de isenção do IR será, finalmente, votado no plenário da Câmara no próximo dia 1º de outubro. O senador Eduardo Braga (MDB-AM) corroborou essa percepção, defendendo que a decisão da CAE de pautar e votar a matéria foi o fator determinante que “forçou” a Câmara a dar andamento ao tema. “Se não fosse a iniciativa da Comissão de Assuntos Econômicos, nós talvez não estivéssemos vendo finalmente a realização de um direito do povo brasileiro e do trabalhador brasileiro ser conquistado”, declarou Braga, sublinhando o papel do Senado na aceleração do processo.

Desde o retorno do recesso parlamentar, no início de agosto, o governo federal tem reiteradamente solicitado a votação da isenção do IR no plenário da Câmara, evidenciando a prioridade que a pauta representa para a gestão.

Divergências sobre Compensação e Implementação

As críticas de Renan Calheiros a Arthur Lira não se limitaram à suposta lentidão na tramitação. O senador alagoano acusou Lira de tentar impedir a elevação das alíquotas cobradas das empresas de apostas online, as chamadas “bets”, de 8% para 12%. Além disso, Calheiros apontou que Lira estaria buscando limitar a tributação de remessas de lucros e dividendos para o exterior. “Retira da tributação as pessoas que percebem maiores salários e maiores dividendos, o que arranca a justiça tributária do projeto do presidente; e outras inovações mais, que o relator [Lira] diz que vai resolver com o plenário da Câmara dos Deputados, porque ele tem uma posição contrária, evidentemente contrária”, criticou Calheiros, sugerindo que as ações de Lira desvirtuariam o objetivo de justiça fiscal da proposta original do governo.

A Defesa de Arthur Lira

Em resposta às críticas e para esclarecer a posição da Câmara, Arthur Lira afirmou que seu relatório é resultado de um acordo entre os líderes partidários e não uma posição pessoal. “O texto não é de um relator, mas fruto de convergência baseada no diálogo e trabalho, para garantir mais justiça tributária. Um passo essencial para o Brasil”, declarou o deputado em uma rede social, buscando legitimar a proposta da Câmara como um consenso construído.

No projeto em discussão na Câmara, a estratégia do governo federal para compensar o alívio fiscal aos mais pobres é a cobrança de alíquotas adicionais progressivas sobre os mais ricos. Essa medida afetaria quem tem rendimentos anuais superiores a R$ 600 mil, podendo atingir o patamar máximo de 10% para aqueles que ganham mais de R$ 1,2 milhão por ano. Essas sugestões, até o momento, foram mantidas no relatório de Arthur Lira.

Alerta sobre Adiamento da Isenção

Renan Calheiros também levantou um alerta sobre possíveis tentativas de adiar a implementação da isenção do Imposto de Renda. Segundo o senador, líderes da Câmara estariam cogitando postergar a entrada em vigor da medida para janeiro de 2027. O argumento seria que a validade em janeiro de 2026 teria “conotação política eleitoral” e influenciaria os resultados das eleições. Calheiros refutou veementemente essa justificativa, questionando: “como se a isenção de quem ganha até R$ 5 mil por mês pudesse esperar dois anos para entrar em vigor?”.

Inovação do Projeto do Senado: Regularização Tributária

Um ponto de destaque e inovação no projeto aprovado pelo Senado, em comparação com a proposta original do governo, é a criação de um programa de regularização tributária. Esse programa seria destinado a contribuintes com dívidas de Imposto de Renda que possuam renda de até R$ 7.350, oferecendo uma oportunidade para que esses cidadãos regularizem sua situação fiscal em condições mais favoráveis.

Entenda a Isenção do Imposto de Renda

Atualmente, a faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) no Brasil se aplica a quem recebe até R$ 2.640 por mês. A proposta de elevar esse limite para R$ 5.000, tanto no projeto do governo quanto no aprovado pelo Senado, representa um alívio fiscal significativo para milhões de trabalhadores brasileiros. Essa medida visa corrigir a defasagem da tabela do IR, que não é atualizada consistentemente há anos, fazendo com que mais pessoas com rendas médias e baixas paguem imposto ou paguem mais do que deveriam, corroendo o poder de compra e a justiça tributária.

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