Reviravolta no Supremo Tribunal Federal
Uma decisão monocrática do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), reverteu um parecer do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e restabeleceu a validade de duas megaoperações contra um esquema de lavagem de centenas de milhões de reais provenientes do narcotráfico em Mato Grosso do Sul. A medida anula um entendimento anterior que havia paralisado as investigações.
A deliberação agora invalidada, proferida pelo ministro Messod Azulay Neto, do STJ, havia considerado ilícitas as provas obtidas por meio de relatórios de inteligência financeira do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), por terem sido requisitados diretamente pela Polícia Federal, sem autorização judicial prévia.
O Impacto da Decisão Anulada
Como resultado direto da decisão do STJ, as operações Prime e Sordidum foram praticamente desmanteladas. A 5ª Vara Federal de Campo Grande determinou o reinício das apurações, a soltura de investigados que estavam presos, a suspensão de medidas cautelares contra os réus e o desbloqueio de bens apreendidos. A justificativa era que os relatórios do Coaf foram o ponto de partida para quase toda a investigação.
A Ação da PGR e a Tese do Supremo
Inconformada com a paralisação, a Procuradoria-Geral da República (PGR) acionou o STF através da Reclamação (Rcl) 81994. No documento, a PGR argumentou que a decisão do STJ ignorava quatro anos de investigações de alta complexidade. A apuração mirava uma organização criminosa com atuação transnacional, que utilizava doleiros no Paraguai e enviava drogas para países da América Central, como Guatemala e Honduras, envolvendo 16 denunciados.
O argumento central da PGR, que foi acolhido por Fux, foi que o entendimento do STJ contrariava uma tese já firmada pelo próprio STF. O ministro relembrou o julgamento do Tema 990 de repercussão geral, no qual o Supremo estabeleceu ser constitucional o compartilhamento de relatórios do Coaf com órgãos de persecução penal, sem necessidade de autorização judicial, desde que o intercâmbio seja formal e ocorra no âmbito de uma investigação já instaurada.
Retomada Imediata dos Processos
Com a nova decisão do STF, os efeitos práticos foram imediatos. Nesta quinta-feira (16), a juíza Franscielle Martins Gomes Medeiros, da 5ª Vara Federal de Campo Grande, determinou a retomada do processo referente à Operação Prime, um desdobramento da Sordidum que já se encontrava em fase mais avançada, com audiências de instrução e julgamento realizadas para réus presos desde maio de 2024.
Em seu despacho, a magistrada revogou decisões anteriores e ordenou o prosseguimento do feito. “À vista da decisão proferida na Reclamação n. 81.994/MS pelo Excelentíssimo Senhor Ministro Luiz Fux, que anulou aquela anteriormente proferida pelo Superior Tribunal de Justiça no Habeas Corpus n. 1.003.812/MS, para ‘[…] reconhecer a licitude do compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira entre o COAF e a Polícia Federal no caso concreto, conforme decidido por esta Suprema Corte no Tema 990 da Repercussão Geral‘, em anexo, revogo toda e qualquer decisão em sentido contrário e determino a retomada da tramitação processual”, afirmou a juíza no documento publicado no Diário de Justiça Eletrônico. As defesas dos réus já foram intimadas para apresentar suas alegações finais.
O Papel do Coaf em Investigações
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), hoje chamado de Unidade de Inteligência Financeira (UIF), é o órgão central do sistema brasileiro de prevenção e combate à lavagem de dinheiro. Sua função é receber, examinar e identificar ocorrências suspeitas de atividades ilícitas, produzindo Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) que são comunicados às autoridades competentes. O compartilhamento desses relatórios com órgãos de investigação, como a Polícia Federal e o Ministério Público, sem autorização judicial prévia, foi objeto de intenso debate jurídico, solucionado pelo STF no Tema 990, que considerou a prática constitucional.
